– O Sr. viu o que aconteceu ?
– Sim, de relance, tinha acabado de dar a curva. Foi nesse preciso momento que me pareceu vê-lo a tentar apanhar alguma coisa, algo parecido com uma máquina fotográfica. Abeirou-se do muro e debruçou-se. Depois simplesmente desapareceu. Parece ter-se desequilibrado.
– Muito bem, podemos ficar com a sua identificação ? Para alguma eventualidade…
– Sim, claro que sim. Tudo o que quiserem. Aqui tem um cartão.
– Obrigado.
– Obrigado. Bom dia Sr. guarda.
As estradas de montanha são majestosas, tudo o que as rodeia requer alguma admiração. Por mais esse motivo, podem tornar-se perigosas. Também sabemos que se não entramos nelas com o espírito próprio facilmente nos irritamos, principalmente quando nos aparece à frente um fulanito que decidiu fazer uma viagem contemplativa e que não podemos ultrapassar durante quilómetros e quilómetros a fio. Colamo-nos a ele, fazemos sinais, guinamos à esquerda, à direita, mostramos a nossa impaciência, aceleramos bruscamente, colamo-nos a ele novamente no sentido de lhe mostrar que podemos ser perigosos, para que se sinta ameaçado, intimidado. Eu não era este, era o outro. Por isso não percebi que depois de tanta teatralidade e irritação, depois de finalmente o ter deixado ultrapassar-me, aquele imbecil tenha parado para tirar fotografias. Parei também e perguntei-lhe se ele não conseguiria fazer um esforço para se harmonizar com a natureza. Evidentemente ficou especado, cara de parvo, a olhar para mim. As mãos transpiradas a segurar uma merdosa Kodak de plástico amarelo. Foi quando decidi ser mediador da terra perante os homens. Da terra vens, à terra tornarás, ou qualquer coisa assim parecida…
fb/2011/05
divinal
não me parece caso para tal elogio 🙂 mas muito obrigado.